Durante as manifestações de 2013 e 2014, ouviu-se o clamor “O Gigante Acordou!”
O povo Brasileiro estava cansado do atraso, da violência, dos abusos, da corrupção, e do eterno rótulo de “país emergente” que nunca emerge.
Morando fora do Brasil a muitos anos, eu desenvolvi um ponto de vista um pouco diferente. Este website é como um diário onde eu pretendo compartilhar algumas idéias e observações de um brasileiro que nasceu e cresceu no Brasil mas teve a experiência de viver em países mais desenvolvidos.
Resolvi começar com este manifesto.
Manifesto “Eu Acordei”
O Problema do Brasil Somos Nós
Desde o tempo do Brasil colônia, há uma separação nas nossas cabeças entre “classes.”
Império contra a colônia.
Brancos contra índios contra negros.
Ricos contra pobres.
Governo contra o povo.
A lista é interminável.
A verdade, no entanto, é que, como brasileiros, somos uma unidade. Somos uma família que compartilha uma casa. Somos irmãos dividindo um quarto.
Esta verdade nunca foi tão clara como hoje em dia, em tempos de democracia.
Como comentei neste outro post, precisamos parar de culpar “grupos” pelos nossos problemas e passar a aceitar a responsabilidade por eles.
O problema do Brasil somos nós. Ele não será resolvido com planos econômicos, leis, ou ideologias políticas. Os problemas do Brasil começarão a diminuir quando nós Brasileiros começarmos a amadurecer e entender que a solução começa com a pessoa no espelho.
Não Veremos Resultados Significativos Nesta Geração
Projetos como o da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016 evidenciaram a falta de capacidade do Brasil de lidar com problemas complexos.
A situação econômica, cultural e social do Brasil é de uma complexidade que faz a Copa do Mundo parecer algo simples como uma partida de futebol.
Mesmo se começarmos a trabalhar seriamente para melhorar este país hoje, não veremos resultados sólidos por muitos anos.
Como nós não desenvolvemos uma cultura de disciplina e paciência, precisamos abraçar a idéia de que para obter resultados daqui a 20, 30 anos, precisamos começar a trabalhar hoje, e não veremos os resultados deste trabalho.
O começo da virada do Brasil será organizado por cidadãos que trabalharão disciplinadamente e nunca receberão os louros da vitória.
Esta é uma atitude servil, altruísta e madura, características que não são o nosso forte, mas quais precisamos desenvolver.
O Governo Somos Nós
Aqui estão os dois grandes problemas da cultura do protesto:
- O protesto assume que o problema a ser resolvido é culpa de um terceiro (no caso recente, o governo)
- O protesto convence o protestante que ele/ela fez algo a respeito do problema
Existem diferentes partidos, diferentes ideologias. Políticos homens, mulheres, gays, héteros, católicos, protestantes, pais-de-santo. Governantes índios, brancos negros.
Na verdade, não existe um segmento da sociedade tão diverso como o dos políticos.
Mas não importa a cor, credo, idade, ou preferência sexual, todos eles têm uma característica em comum.
A nacionalidade.
Nós no Brasil temos esta tendência de criticar o governo como se ele fosse um grupo alienígena que desceu de marte para nos oprimir.
Os governantes são brasileiros como eu e você.
Eles estudaram nas mesmas escolas, cresceram com famílias parecidas, comeram as mesmas comidas, brincaram com os mesmos brinquedos que eu e você.
E além disso, eles são eleitos democraticamente. Eu e você os colocamos lá.
O governo somos nós.
Os Problemas do Brasil Serão Resolvidos de Baixo Para Cima
Se os problemas do Brasil forem resolvidos, isso acontecerá de baixo para cima.
Como diz a tagline deste website,
O sábio corrige primeiro a si mesmo, depois à sua família, depois à sua rua, depois ao seu bairro, depois à sua cidade, depois à sua nação.
Veja bem: o político que embolsa dinheiro público e abusa de seu poder, é o mesmo cidadão comum que, com menos autoridade antes de ser eleito pirateava software.
O cidadão que falsifica carteirinha de estudante para pagar meia entrada, é a mesma pessoa que, em posição de poder, falsificará um outro documento para receber uma propina.
O poder, como uma lupa, aumenta as falhas de caráter que já vinham do berço.
Enquanto continuarmos vivendo numa cultura onde a lei de Gérson reina e ensinamos nossos filhos a levar vantagem em tudo, nossos governantes continuarão sendo corruptos, ladrões, e irresponsáveis.
É uma certeza quase que matemática.
O nosso problema é mais em baixo. É um problema cultural, e somente quando estivermos dispostos a encará-lo como tal começaremos a mover na direção certa.
Mudanças de Governo e Regime Não Resolverão Nada a Longo Prazo
Como o nosso problema tem base na nossa cultura, mudanças de governo e regime tratam apenas dos sintomas e não das reais causas.
Desde o nosso descobrimento, já fomos colônia, império, república, já tivemos ditadores, regime militar, democracias.
No entanto nossa situação parece só piorar.
Einstein definiu insanidade como “fazer a mesma coisa repetidamente esperando resultados diferentes.”
Mudar de regime e governo pode mudar algo a curto prazo, mas não resolverá nossos problemas. Já o fizemos várias vezes. É hora de tentar outra coisa.
Aprendamos Com Outros Povos
Uma das coisas que mais me ajudam em minha vida profissional e pessoal é ouvir a opinião de terceiros e aprender com a experiência dos outros.
O Brasil é um país isolado culturalmente. Falamos uma língua que quase ninguém mais no mundo fala, nossa música é diferente, assistimos nossa própria televisão, e nossos vizinhos na América do Sul parecem estar todos em um clube hispânico para o qual não fomos convidados.
No entanto, existem outros países pelo mundo afora que têm muito para nos ensinar, só precisamos aprender a olhar e aprender com uma mente aberta.
A Única Pessoa Que Posso Mudar Sou Eu
Como eu disse antes, nosso problema é mais embaixo.
A boa notícia é que estamos todos equipados para começar a resolver nossos problemas.
É um dos ensinamentos básicos de qualquer dinâmica de grupo que somente conseguimos mudar a nós mesmos.
Aproveitemos então esta oportunidade de mudar nosso país fundamentalmente: mudemos a nós mesmos.
Tentar resolver problemas pondo a culpa nos outros nunca funcionou. Os outros não mudam, os problemas pioram, e criamos divisões desnecessárias.
Decidamos hoje a sermos melhores, mais honestos, mais disciplinados, mais altruístas, e mais maduros.
O Princípio do “Ninguém Olhando”
Nosso caráter se define pelo que fazemos quando ninguém está olhando. – H. Jackson Brown, Jr.
Perdemos tanto o senso do certo e do errado no Brasil, que fazemos coisas erradas até mesmo quando todos estão olhando.
Como expatriado, uma das coisas que notei em estrangeiros de países mais avançados é um senso de responsabilidade que vai além das aparências. Estas pessoas fazem a coisa certa, quase sempre uma inconveniência, até mesmo quando ninguém está olhando.
Na minha opinião, um ótimo exercício para começarmos a mudar o país é começar a fazer a coisa certa quando ninguém está olhando.
Jogue o lixo no lixo, quando ninguém estiver olhando.
Compre o mp3 ao invés de copiá-lo ilegalmente, quando ninguém estiver olhando.
Dê seu lugar no ônibus ao idoso, quando ninguém estiver olhando.
Devolva o troco que lhe foi dado a mais por engano, quando ninguém estiver olhando.
Limpe a calçada, quando ninguém estiver olhando.
O Problema Em Dividir a Sociedade
Uma das táticas dos que não sabem como ou não querem realmente resolver problemas é botar a culpa nos outros.
Para isso, é sempre necessário definir quem são “os outros.”
O resultado é sem exceção a segmentação da sociedade.
Acabamos nos dividimos por raça, condição financeira, ideologia, religião, idade, sexo, preferência sexual, etc.
Esta segmentação faz possível colocar a culpa deste ou daquele problema num grupo. No processo, líderes são gerados, movimentos germinam, e um país que precisaria estar trabalhando unido, começa a brigar entre si.
Apontemos nossos dedos na nossa própria direção antes de botar a culpa num grupo.
Todos somos parcialmente responsáveis pelos problemas da nossa nação.
Eu Acordei: Tudo Começa E Termina Comigo
Em resumo: quando dizemos que “o gigante acordou,” há aí uma “terceirização” da responsabilidade.
Quem precisa acordar não é o gigante.
Quem precisa acordar sou eu.
O gigante não existe, mas é composto de milhões de cidadãos como eu e você.
A notícia má é que a culpa é minha.
A notícia boa é que eu sou capaz de mudar e como consequência resolver o problema.
Eu acordei. E você?
